Estruturas Pré-Moldadas

Dimensionando as vigas de uma estrutura pré-moldada

O uso de concreto pré-moldado em edificações normalmente está associado à velocidade de construção, eficiência e versatilidade arquitetônica. Com o constante acréscimo da necessidade de processos construtivos que busquem as características acima de forma cada vez mais otimizada, pode-se concluir que a pré-fabricação das estruturas de concreto é um processo industrializado com grande potencial para o futuro. Todavia, a pré-fabricação ainda pode ser vista por algumas pessoas como se fosse apenas uma variante técnica das construções de concreto moldadas no local. Isso se deve à falta de profissionais com experiência neste tipo de concepção estrutural, gerando assim certa resistência por parte destes profissionais na escolha pela pré-fabricação. Além disso, a falta de conhecimentos acerca do processo construtivo utilizando a pré-fabricação resulta em projetos que não aproveitam toda a potencialidade deste sistema, o que também pode ocultar as reais vantagens da pré-moldagem.

Identificando os erros nas vigas

Conforme levantamento realizado no primeiro artigo desta série, no projeto exemplo foram identificados problemas nas vigas do pavimento Cobertura e nas vigas do pavimento Térreo:

 

Vigas do pavimento Cobertura (vigas com erro em azul)


Vigas do pavimento Térreo (vigas com erro em azul)

É necessário verificar quais os códigos de erro informados pelo programa, pois somente assim será possível identificar as melhores soluções para as vigas. Para verificar os erros em cada elemento, pode-se calcular todas as vigas e verificar, uma a uma, quais estão com erro. Realizando este procedimento no pavimento Cobertura, verificou-se que as vigas estavam com erro na armadura positiva (Erro D15 - Erro na armadura positiva (Vão ***)), apresentando para todas as bitolas o Erro A17 - Erro na armadura do grampo.

Partindo para o pavimento Térreo, também foi verificado o erro A17 para as vigas, além do Aviso 87 - Excentricidade excessiva no consolo para outras vigas no detalhamento. Lembrando que erros impedem o detalhamento do elemento, enquanto que avisos são emitidos ao detalhar, de forma a alertar o projetista sobre uma possível situação de erro no lançamento ou verificação que deve ser feita adicionalmente.


Janela de erros de dimensionamento de uma viga

Erro na armadura do grampo (A17)

Conforme indicado no artigo Erro A17 - Erro na armadura do grampo, este ocorre para as armaduras dos grampos de ancoragem. No caso específico de estruturas pré-moldadas, tem-se que a largura de apoio para a ancoragem das barras positivas das vigas restringe-se ao comprimento do aparelho de apoio (neoprene), que normalmente é reduzido em relação ao comprimento do consolo, devido aos afastamentos considerados em relação às faces deste. Quando o comprimento do neoprene não é suficiente para que as barras sejam devidamente ancoradas, o programa inclui automaticamente grampos para completar a ancoragem, de acordo com a configuração "Dimensionamento - Vigas - Ancoragem". Quando nem mesmo essa solução é suficiente ocorre, então, o erro A17. Com isso, para eliminar este erro torna-se necessário em alguns casos, por exemplo, aumentar o comprimento do consolo, aumentando, com isso, o comprimento do neoprene.

Sobre este assunto, cabe acrescentar que o comprimento de ancoragem necessário das barras positivas será maior tanto quanto maiores forem os momentos positivos nas vigas, uma vez que esta situação gera maior quantidade de armadura a ser ancorada. Dessa forma, uma outra maneira de evitar o erro A17 é revisar o modelo estrutural e alterá-lo, de modo a obter esforços menores e, portanto, menor quantidade de barras de armadura positiva.

Aviso de excentricidade no consolo

O Aviso 87 é emitido sempre que pelo menos uma das excentricidades do consolo (ex e ey), apresentadas no relatório de cálculo do consolo para viga, resultar fora da região limite apresentada na figura abaixo. O programa verifica se a resultante das cargas está sendo aplicada no terço médio do aparelho de apoio, sendo que esta região define o limite da posição da carga fictícia para que não ocorram tensões de tração no aparelho de apoio:


Região limite para a resultante de cargas no consolo

Seguindo as hipóteses de cálculo do item 7.3.2.2 da NBR 9062:2017, a armadura do tirante do consolo é que deve resistir aos esforços horizontais que tracionam a ligação entre o consolo e o elemento. Dependendo destes esforços, a largura da viga inicialmente adotada pode não ser suficiente para ancorar este tirante, gerando o erro no dimensionamento do tirante.

Em relação à excentricidade pode ocorrer ainda, especialmente no caso de vigas que se apoiam em outras vigas, efeitos de torção nas peças, que são transmitidos para o consolo. Com isso, é gerado um binário de esforços no consolo, contribuindo com o aumento da excentricidade das cargas.  Nestes casos as possíveis soluções seriam enrijecer o modelo, adotando ligações semirrígidas, aumentar a largura da viga ou ainda aumentar a quantidade e bitola do pino.

OBS: O Aviso 87 também pode ser emitido para o pilar pré-moldado, ocorrendo para as mesmas situações descritas anteriormente, mas para um consolo de um pilar ao invés de consolo em viga.

Verificação das flechas excessivas

Além dos erros de dimensionamento listados acima, em ambos os pavimentos, foram calculadas as flechas diferidas das vigas, a partir das quais verificou-se que estas apresentam ainda erros de flechas excessivas:


Janela de aviso de flecha excessiva para diferentes vigas

Verificação da estabilidade global

Em modelos que apresentam problemas de flechas excessivas em vigas é usual que ocorra ainda problemas de instabilidade na estrutura, uma vez que nestes casos as vigas não formam pórticos juntamente aos pilares, não travando a estrutura. Com isso, os esforços de 2ª ordem e os deslocamentos no topo da estrutura são mais elevados, excedendo os limites exigidos nas verificações de estabilidade. Esta situação ocorre para o caso do projeto exemplo, conforme se pode verificar no pórtico unifilar da estrutura e também nos resultados do processamento.


Deslocamentos elásticos no pórtico unifilar da estrutura


Janela de resultados do processamento - Deslocamentos na estrutura calculados pelo Processo P-Delta

Resolvendo os erros das vigas

Como primeira opção para eliminar o erro A17 nas vigas, optou-se por aumentar o comprimento dos consolos dos pilares, que inicialmente foram lançados com apenas 20 cm. Tendo-se aumentado o comprimento “lc” para todos os pilares para 30 cm, a estrutura foi reprocessada. Com isso, todas as vigas do pavimento Cobertura puderam ser dimensionadas, além de algumas vigas do pavimento Térreo. As vigas com erro são indicadas em azul nos diagramas:


 Vigas da Cobertura (todas dimensionadas)


Vigas do Térreo (vigas em azul ainda com erro)

Com exceção das vigas V1 e V5, que apresentavam o Aviso 87, as demais vigas ainda encontram-se com o erro A17, referente à armadura do grampo. Lembrando que o comprimento de ancoragem é maior conforme maior for a necessidade de barras positivas nas vigas, uma outra opção para que o erro A17 seja eliminado é alterar o modelo estrutural de modo a reduzir os momentos fletores positivos nas vigas, reduzindo assim a quantidade de armadura para resistir a estes esforços.

Uma forma bastante eficaz na redução de momentos positivos em vigas pré-moldadas é a consideração de uma seção de 2º estágio (seção concretada na obra), a partir da qual poderão ser consideradas ligações semirrígidas entre os pilares e as vigas. Com isso, os momentos fletores serão redistribuídos, ocorrendo momentos negativos nas continuidades com os pilares e uma redução dos momentos positivos. Em estruturas pré-moldadas, as ligações semirrígidas podem ser obtidas através da solidarização entre vigas e pilares com barras passantes, por exemplo, as quais serão colocadas na obra. Veja mais em: Ligações semirrígidas em vigas pré-moldadas.

Com base na verificação das vigas que ainda encontram-se com erro devido à armadura do grampo, segue uma figura exibindo as vigas para as quais foram adotadas seção em 2º estágio e os apoios em que foram consideradas ligações semirrígidas:


Vigas com 2º estágio em destaque e ligações semirrígidas indicadas

Observação: Para as ligações semirrígidas indicadas acima, foram consideradas 4 barras de 16.0 mm.

A partir das alterações acima, todas as vigas que estavam com erro referente à armadura do grampo foram dimensionadas, e foi encontrado o Erro D137 – Erro na armadura principal do consolo para a V1 e a V5. Diante deste resultado, o que ocorre para estes elementos é que as armaduras calculadas para o consolo não podem ser montadas para a atual seção definida para este, sendo sugerido alterar a seção das vigas de 25 cm para 30 cm de largura e de 60 cm para 70 cm de altura.

Após a alteração acima a estrutura foi novamente reprocessada, sendo que o erro D137 ainda persistiu para as vigas V1 e V5. Com isso, suspeitou-se de estarem ocorrendo esforços elevados no consolo, especialmente devido aos efeitos de torção que ocorrem na viga. Assim, como forma de aumentar a força resistente do binário que combate a torção de equilíbrio, optou-se por aumentar o diâmetro dos pinos de ancoragem nas ligações consolo-viga para 16.0 mm, no menu Estrutura - Configurações - Projeto - Dimensionamento - Pilares PM.

Desse modo, todas as vigas do projeto foram dimensionadas com sucesso.


 Vigas do pavimento Térreo sem erros

Flechas nas vigas e estabilidade do modelo estrutural

Apesar dos erros de dimensionamento terem sido eliminados para as vigas do projeto, é muito importante que sejam verificadas também as flechas das vigas, pois em um projeto real existem limites de deslocamentos que devem ser respeitados, seguindo as prescrições da NBR 6118:2014.

A partir do cálculo das flechas das vigas do pavimento Térreo após as alterações realizadas no modelo, foram encontradas flechas excessivas para as seguintes vigas:


Flechas diferidas nas vigas após alterações no modelo

É importante ressaltar que antes das alterações sugeridas a grande maioria das vigas do pavimento encontrava-se com problemas de flechas excessivas, conforme figura anterior deste artigo. Agora, tem-se poucos elementos com problemas de flechas, tendo-se reduzido tais deslocamentos. Cabe acrescentar que a redução das flechas das vigas deste pavimento ocorreu especialmente devido à alteração das ligações rotuladas para semirrígidas entre vigas e pilares, as quais enrijecem a estrutura e possibilitam que as vigas formem pórticos com os pilares, reduzindo os deslocamentos do modelo e, portanto, contribuindo com a estabilidade do sistema.


Deslocamentos elásticos no pórtico unifilar antes e após as alterações

Autora: Engª Micheli Maria Mohr